Finalmente assisti ao O Batman (The Batman) e pude constatar que o personagem do Homem-Morcego está em processo de desconstrução. A história do garoto que teve seus pais assassinados e decidiu se tornar um Cruzado Encapuzado a fim de lutar contra o mal numa sociedade decadente, assombrando os bandidos e tentando salvar sua cidade, no novo longa de Matt Reeves ganhou novos contornos.
No novo filme de Reeves, nem a fotografia sombria bem ajustada com a paleta de cores do super-herói, nem a trilha sonora muito bem executada por Michael Giacchino conseguiram disfarçar que o Homem-Morcego está fazendo uma travessia a fim de abraçar o espírito do tempo. Os gibis já apontavam a transição do vigilante mascarado para uma versão mais “humanizada” e menos assustadora. O cavaleiro das trevas, a figura fria e aterrorizante, a personificação da vingança se tornou uma pessoa comum em meio às outras pessoas e está em busca da aceitação dos moradores da cidade.
O Batman de Robert Parttinson está em crise de identidade. A promessa é que no futuro próximo irão “amenizar” sua aparência a fim de que obtenha melhor popularidade. Sinal dos tempos. Do jeito que a coisa anda, Batman vai parar de espancar bandidos pelas ruas de Gotham City, entrar para a política, se tornar prefeito e defender o politicamente correto. No filme, o discurso antissistema permanece com os feridos e marginalizados da cidade fazendo frente a elite política corrupta. O novo vilão da trama é um órfão que se vinga, tornando-se um justiceiro que pune os mentirosos e criminosos da cidade, a margem das instituições apodrecidas.
Charada é uma vítima rebelde da sociedade que acredita que Gotham merece perecer junto com seu submundo de fraudes e sua interminável rede de crimes. Ele recruta outros feridos para sua cruzada de pôr fim à corrupção sistêmica mesmo com o sacrifício de vidas inocentes. Então, na escuridão dos becos de Gotham surge o Homem-Morcego que acredita na reabilitação da cidade e faz papel de detetive investigativo.
Batman aparece em meio as pessoas e não se esconde mais na escuridão. O herói perdeu seu brilho. Sob o manto do Homem-Morcego Robert Pattinson surge apático. Falta energia ao ator. O protagonista de o Crepúsculo é um ótimo vampiro, mas o Batman precisa de “sangue nos olhos”. Bruce Wayne não é mais um milionário excêntrico, não tem vida social e nenhuma habilidade relacional. Introspectivo e triste, não sorri e não faz declarações irônicas. O Battinson não empolga. Recluso e quase emo, o morcegão faz uma jornada moral enquanto busca a validação da cidade.
Em sua nova versão light, não pretende assustar mais ninguém. Wayne aparece com lápis de olho borrado dentro de sua Batcaverna. O longa não merecia uma seqüência. A desconstrução do personagem seguirá seu ritmo.
Acho que vamos ficar com saudades do Batfleck. Melhor mesmo seria ter parado na sensacional trilogia de Nolan. Mas, para não dizer que tudo é ruim, o discurso final sobre esperança é bastante válido. Sua jornada de trocar a vingança pela esperança é uma boa mensagem. A lógica de que a raiva que o consome o torna tão igual ao inimigo contra quem está lutando é uma parte positiva do filme.